quarta-feira, 31 de agosto de 2011

REPENSAR A EDUCAÇÃO FÍSICA É MAIS QUE UMA NECESSIDADE É NOSSA OBRIGAÇÃO


01 DE SETEMBRO  DIA DO PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA

A Educação Física Escolar, seus caminhos e descaminhos.
 
A cada dia percebo como é difícil uma mudança de modelo, mas não impossível, dependendo apenas de algumas ações concretas em direção a esta mudança tão esperada.

A Educação Física Escolar através do tempo vem colaborando para a manutenção de valores de uma determinada classe social que prega, entre outras coisas, a valorização do individualismo, levando em conta apenas as habilidades motoras e selecionando pessoas como aptas e não-aptas.
Passar de um modelo conservador e militarista, em que só a competição e a exclusão são valorizadas para um novo que valorize a relação professor-aluno e invista em ações cooperativas dentro das aulas, talvez seja fácil, mas a meta não é criar um novo paradigma, pois este, mais cedo ou mais tarde, com toda certeza se esgotará. A busca é por uma nova consciência. Esta transformação também não é trabalho apenas para uma pessoa, pois, isoladamente, nada conseguiremos, portanto, a idéia é somar o máximo de pessoas em torno deste ideal e, a partir daí ousar sonhar com uma nova EFE, mais justa, democrática e que valorize todas as diferenças.

A EFE pode e deve contribuir no processo de ensino-aprendizagem dessa nova consciência, mas para que isto ocorra é necessária uma nova abordagem, pois a atual já está esgotada, uma vez que reforça uma cultura de exclusão. Penso que o mais viável seria criar e sustentar dentro das escolas uma pedagogia cooperativa, cuja aula de EFE se transforme num espaço onde todas as diferenças possam conviver e aprender umas com as outras, em harmonia, sendo respeitadas e, mais que isto, valorizadas. 
 Apenas com discurso nada será transformado; precisamos arregaçar as mangas e trabalhar muito em busca da EFE que acreditamos ser a melhor para a formação de nossas crianças e, que por meio dela possamos transformar o futuro. Quando perguntamos a qualquer professor de Educação Física o que é preciso para que ela seja ressignificada, tornando-se transformadora, temos várias respostas positivas. Felizmente, a Educação Física militaresca, discriminatória e excludente, que as pessoas conheceram e valorizaram um dia, não tem mais como existir dentro da escola, que agora deve ser para todos. Quando o professor de Educação Física Escolar arranca de um jogo uma criança, ele está negando a ela o direito a uma prática pedagógica, que é fundamental para a formação do tão sonhado ser humano integral. O professor de Língua Portuguesa, por exemplo, não pede para a criança que não sabe nada sobre verbo ficar de fora de suas aulas. Pelo contrário insiste em que ela aprenda. Saindo precocemente do jogo ou da aula de Língua Portuguesa, ela ficará privada de aprender. O professor não deve ser apenas treinador de habilidades, mas sim, um despertador de habilidades, pois trabalhar com as habilidades é fácil, difícil é propiciar habilidades a quem não tem.
Muitos autores já escreveram sobre isso, mas acredito e reafirmo que só com discurso nada se mudará, pois se fala muito e faz-se pouco.
A mudança deve ser gradual e o primeiro passo deve-se colocar meninos e meninas dentro de uma mesma aula, investindo em uma troca de competências em um processo de co-educação e negando a tão famigerada cultura da separação do futebol para os meninos e queimado para as meninas.

Existem muitas saídas para a Educação Física Escolar, porém pretendo falar sobre algumas delas, como a criação do jogo da escola (como conceitua Lino Castellani), do jogo possível a todos (Roberto Paes), do jogo que educa (João Batista Freire), da Educação Física plural (Jocimar Daolio), do jogo cooperativo (Fabio Brotto) ou da Educação Física inclusiva, valorizando a cultura corporal de movimento, e fazendo com que a aula de Educação Física seja um espaço para todos, sem exceção. Talvez o ideal seja abarcar e abraçar todas essas propostas em uma só.
Cabe aqui fazer uma pergunta. Qual é o jogo valorizado pela Educação Física Escolar hoje em dia? Será que corresponde com a expectativa que temos em relação à nossa sociedade?

Até por um total desconhecimento, na grande maioria das vezes, é o jogo com caráter competitivo, que é uma cópia fiel do esporte de alto rendimento, em que o que vale não é a participação, mas sim a aptidão física para vencer. Serve para selecionar pessoas, formar equipes "competitivas" e, em resumo, para excluir. Alguns professores baseiam-se no lema das Olimpíadas, "citius, altius, fortius", que significa mais rápido, mais alto, mais forte, e, cada vez mais exigem perfeição. Agindo assim, muitas vezes estão dando as costas para a EFE, claro que muitos, de forma inconsciente, pois não avaliam o mal que fazem à própria área. Em competição já somos todos especialistas, pois tivemos uma vida inteira de treinamento dentro dessa maneira de jogar e viver. Basta voltar ao tempo e lembrar os jogos de que participamos dentro da escola para percebermos porque isso acontece.

Se quisermos ver esta transformação refletida em nossa sociedade não podemos mais reforçar a competição, acreditando que a vida deve ser somente para alguns. Existe uma corrente, que apesar de tudo ainda resiste, que é a das pessoas que acreditam em uma mudança de consciência. Por que não criar, propor e sustentar novos jogos e atividades, em que a tônica seja o jogar com o outro, passando a enxergar o tão temível adversário como um solidário, ou seja, mais um que joga para ajudar na busca do objetivo final? O Esporte Educacional já poderia ser uma realidade, pois prega a participação de todos, do menino jogando junto com a menina, valorizando a cooperação, num processo de co-educação. Há alguns anos venho tentando modificar pessoas e percebi que só muda quem assim o deseja, pois é muito difícil fazer brotar algo que o outro ainda não tem. Depois dessa descoberta, o que faço é tentar seduzir a respeito da possibilidade de a Educação Física Escolar poder formar um ser humano mais cooperativo, honesto, crítico, independente e feliz.
 

A escola não deve mostrar só um lado da moeda (competição), pois existem muitas verdades e cada um tem a sua. Ela deve indicar duas maneiras (é claro que existem outras) que o ser humano tem para viver e jogar: Cooperação e competição. Lembro as palavras de Leonardo Boff: "Um ponto de vista é apenas a vista de um ponto".
Quem vai escolher é a criança, mas só escolherá se conhecer as duas, se perceber quais as diferenças e como se sente melhor: cooperando ou competindo? 
 Muitos imaginam que a graça do jogo está na competição, ou que a competição seja o aditivo principal do jogo. Há até os que acreditam ser o jogo sinônimo de competição. Para eles uma mensagem: Para a criança tanto faz cooperar ou competir, o que ela quer é o prazer de jogar, a alegria e descontração que o jogo pode proporcionar, seja ele cooperativo ou competitivo. Terry Orlick (pesquisador canadense) diz que um jogo pode nos formar em direções variadas. Qual é a direção que nós, educadores, queremos para a nossa sociedade? Qual a direção que já estamos? Dá para mudar? Como? Existe um caminho, que seria desmistificar a competição e ritualizar a cooperação em todos os momentos possíveis, pois em competição todos nós já somos especialistas. Que tal dar uma chance para a cooperação, reeducando por meio dos Jogos Cooperativos?
 
Espero ver dentro de todas as aulas de Educação Física Escolar, o gordinho, o magrinho, a menina, o menos hábil, o mais hábil, o portador de necessidades especiais, enfim todos os que, por uma razão ou outra, ainda se encontram excluídos. Aquele aluno que geralmente fica fora das aulas de EFE, é quem na realidade mais precisa delas, então, o modelo deve ser questionado e revisto. Por que insistir na prática dos chamados jogos escolares com o formato excludente, em que só os melhores têm vez? Por que não inventar os jogos escolares para todos, sem exceção? Para isso, os professores precisarão sentar e, discutir e tentar reinventar essa tal EFE, deixando de lado vaidades, pois o melhor professor não é aquele que ganha troféus para a sua escola, ou o que tem mais "atletas" em seu time. O troféu e o atleta são pura ilusão, pois na maioria das vezes não foram, na realidade, conquistas do professor. O menino que joga melhor, muitas vezes treina fora da escola, em clubes ou escolinhas de esportes, não sendo portanto, fruto do trabalho do professor. O professor deve perder a ansiedade de querer especializar crianças em determinados esportes e tentar formar uma bagagem motora rica e diversificada, para aí sim no futuro estarem aptas a jogar qualquer esporte.
 
O professor de Educação Física tem um papel importante na formação de novas normas, valores e atitudes que, certamente irão modificar a paisagem que vemos pela janela e da qual não gostamos. Apenas dizer que a competição faz parte da vida não ajuda, pois com toda certeza quem afirma isto não gosta do que vê. Não podemos perder o poder de indignação e devemos tentar, de alguma forma, modificar por meio das aulas o olhar sobre a vida, passando de uma visão de exclusão para uma nova visão, agora valorizando a inclusão de todas as diferenças.
Escola para ser boa deve ter movimento e sonhos, pois do contrário não irá cumprir o seu papel fundamental, que é transformar uma realidade difícil. Escola sem movimento e sonhos "já era", faleceu e esqueceram de enterrar. Sem falar e imóvel, só conseguiremos conservar o que já existe.
Escola é coisa muito séria e EFE deveria ser também. É chegada a hora de ajustarmos nossas estratégias e energia numa única direção, na direção de uma proposta transformadora que possa educar a Educação Física.

Prof. Francisco Marcondes Gonçalves

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